Problemas na decodificação dos sons prejudica desempenho escolar
Um filho que tira boas
notas na escola é motivo de orgulho para qualquer pai ou mãe. O bom desempenho
depende de vários fatores, como a motivação e habilidade do aluno. Mas o que
fazer quando a criança apresenta dificuldades de leitura, escrita, compreensão
de textos, problemas de memória e não consegue acompanhar as aulas? Rita de
Cássia Cassou Guimarães, otorrinolaringologista e otoneurologista, explica que
estes são alguns sintomas do distúrbio do processamento auditivo central
(DPAC). “O DPAC afeta a capacidade de entendimento dos indivíduos”, afirma.
Quem sofre com o DPAC
ouve, mas não consegue interpretar os sons. Outros indícios do distúrbio no
indivíduo são dificuldades para manter atenção aos sons, é preciso ser chamado
várias vezes para responder, não entende ideias abstratas, piadas ou expressões
de duplo sentido, pede para repetir as informações com frequência e tem
problemas de fala. “A pessoa também não consegue acompanhar uma conversa com
outras pessoas falando ao mesmo tempo e tem dificuldades para localizar a
origem dos sons. É comum a troca de letras, como /l/, /r/, /e/, /s/ e /x/”,
ressalta.
Os indivíduos com DPAC
não possuem problemas no ouvido e sim em áreas auditivas no sistema nervoso
central. O transtorno afeta o processamento dos estímulos sonoros, que além de
não ser feito corretamente é mais lento do que o normal. Sem a decodificação
perfeita, os sons tornam-se ruídos incompreensíveis. “O processamento auditivo
pode ser definido como o processo de decodificação das ondas sonoras, que tem
início na orelha externa e termina no córtex cerebral. É a capacidade de
analisar, interpretar e associar as informações sonoras”, destaca.
O principal obstáculo é
identificar o DPAC - muitas vezes o paciente é diagnosticado com outras
patologias e é submetido a tratamentos ineficazes. A demora no diagnóstico
correto e a concomitância de outros distúrbios, como a dislexia e o
déficit de atenção (TDAH), contribuem para a baixa auto-estima da criança. “Não
existe um consenso sobre as causas do DPAC. Permanência em UTI-Neonatal por
tempo superior a 48 horas, fatores genéticos, otites nos três primeiros meses
de vida, e experiências auditivas insuficientes durante a primeira infância
podem ser associadas ao distúrbio”, esclarece.
Outras hipóteses afirmam
que o DPAC é desencadeado por lesões nas vias de condução dos sons, doenças
neurodegenerativas, dependência química e alcoolismo materna, rubéola, sífilis,
toxoplasmose. Nenhuma destas suspeitas foram comprovadas cientificamente. “Para
diagnosticar o DPAC é preciso fazer testes especiais, exames que avaliam a
audição central, o cérebro, e o processamento dos sons e uma entrevista
detalhada com o paciente, que ajuda a determinar as melhores estratégias para a
reabilitação”, observa.
A especialista enfatiza
que ainda não há cura para o DPAC, mas é possível ‘ensinar’ o cérebro a
responder a novos estímulos. Isto é possível graças à neuroplasticidade –
capacidade para se moldar a uma nova realidade. “É fundamental que o tratamento
seja interdisciplinar, com a atuação de otorrinolaringologistas,
fonoaudiólogos, neuropediatras, psicopedagogos e neuropsicólogos. A
reabilitação proporciona melhora na qualidade de vida e um cotidiano normal
para os estudantes”, evidencia Rita, mestre em clínica cirúrgica pela
Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Com o tratamento, o
paciente aprende a desenvolver outros mecanismos e caminhos diferentes para
superar o distúrbio. Não há um tempo exato de reabilitação, tudo depende da
gravidade do DPAC. O suporte da família e da escola é imprescindível para a
melhora do quadro. “O aluno que tem o problema deve sentar na primeira carteira
e o professor deve ser orientado a falar devagar e olhando para o estudante,
assim a criança não fica dispersa”, acrescenta a médica, responsável pelo
Setor de Otoneurologia da Unidade Funcional de Otorrinolaringologia do Hospital
de Clínicas da UFPR.
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